Lembrou então que era sábado e feriado, que não precisaria manipular medicamentos, comprimidos, pomadas, xaropes de todo tipo, na farmácia onde trabalhava pela manhã. Nem ir à tarde ao laboratório de análises clínicas onde se dedicava a revelar os segredos, ora terríveis ora constrangedores, que as excreções e secreções humanas abrigavam.
"O álcool tinha afinal razão. Hoje folgo. Que isso sirva de lição pra você, Marta!", disse pra si e sorriu aliviada. Foi aí que se lembrou do gato, isto é, de Marta que esperava silenciosa e paciente numa caixa de papelão na cozinha. "Eita! A bichana! Por isso liguei o despertador. Tenho que dar um fim nesse bicho. Ligar pra umas amigas, uma ong de adoção, jogar no triturador da pia, alguma coisa. Maldita cachaça! Mas antes de qualquer coisa eu alimento a pobre".
Marta subiu de volta até o décimo terceiro andar, encontrou novamente o rapaz bonitinho, que havia esquecido algo na vizinha, mas já estava de saída, tchau!, abriu a porta de casa, a geladeira, bonitinho mesmo!, tomou um copo do leite gelado, comeu a metade de um mamão papaia, algumas bolachas com requeijão e geleia, esqueceu de escovar os dentes, deixou o assunto felino pra logo mais, caiu outra vez na cama e se espreguiçou nos braços de Morfeu.
Quando acordou, por volta das onze, na porta de seu quarto, exatamente no limite entre a sala e o corredor, sentadinho, Marta miava sua fome sem perturbar o silêncio que o mundo poderia ter se silencioso fosse.
"Putz!"
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